Novos Pátios

O carisma salesiano frente às urgências dos novos pátios

Temos toda uma geração que corre o risco de não apenas refugiar-se numa bolha promovida pelas tecnologias e mídias digitais, mas também de adoecer gravemente pelos problemas que o uso descontrolado da tecnologia pode acarretar.
Ir. Márcia Koffermann, FMA / Foto: Zivica Kerkez

Quando Dom Bosco andava pelas ruas de Turim e deparava com uma imensidade de crianças e jovens abandonados ou que passavam os dias percorrendo as ruas sem alguém que se preocupasse com eles, essa realidade o provocou interiormente, pois sabia dos perigos e riscos a que estavam sujeitos. Era uma realidade que o desafiava, fazendo-o ser criativo para dar uma resposta àquela situação de fragilidade, o que se concretizou por meio dos oratórios.

Hoje, além das realidades dos menores abandonados, encontramos outros espaços igualmente nocivos à saúde e ao bem-estar de crianças, adolescentes e jovens. Em uma pesquisa realizada em 13 capitais brasileiras pelo Ministério da Saúde e pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, verificou-se que um terço das crianças brasileiras de até 5 anos fica mais de duas horas diariamente diante das telas. Entre os adolescentes de 8 a 17 anos, esse tempo aumenta para uma média de quatro horas diárias.

Questão de saúde
Há outras pesquisas divulgadas que revelam os hábitos de navegação dos adolescentes. Uma delas, um questionário on-line da Phone Life Balance, realizado globalmente pela Motorola, em 2018, aponta que 60% dos jovens têm o smartphone em mãos durante metade do dia. Outros 30% mantêm o celular ao seu lado durante as 24 horas do dia, ou seja, o deixam próximo até enquanto dormem.

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Não se trata de culpabilizar as famílias nem mesmo de desconsiderar as altas jornadas de trabalho e as dificuldades que os pais encontram para dar o necessário para seus filhos.

Se confrontamos esses dados com outros relativos à saúde de crianças, adolescentes e jovens, essa realidade se torna mais preocupante. Segundo dados da Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP, cerca de 10% de todas as crianças e adolescentes têm ou terão algum tipo de ansiedade. Outras pesquisas apontam que até 68% dos adolescentes sofrem com dependência moderada em relação às tecnologias e mídias sociais, e 20% podem ser enquadrados em um quadro de dependência grave. E não bastasse ainda a utilização das tecnologias digitais por crianças e adolescentes, a cada dia mais aplicativos, softwares e novidades surgem para um novo público-alvo: os bebês.

Esse é um contexto que precisa ser pensado do ponto de vista salesiano e, por consequência, do Sistema Preventivo. Temos toda uma geração que corre o risco de não apenas refugiar-se numa bolha promovida pelas tecnologias e mídias digitais, mas também de adoecer gravemente pelos hábitos que geram dependência, ansiedade e uma série de outros problemas que o uso descontrolado da tecnologia pode acarretar.

Desafio para as famílias e os educadores salesianos
Mais do que nunca, se faz necessário que os ambientes educativos promovam ações e práticas que permitam às crianças e aos adolescentes crescerem saudáveis, em comunidade, acompanhados por adultos reais e presentes em sua vida. No entanto, nenhuma ação isolada será capaz de gerar uma mudança neste quadro se não houver um trabalho de parceria e cooperação com as famílias. Inclusive porque há pesquisas que indicam que o número de horas que os filhos ficam conectados aos dispositivos digitais é muito semelhante ao dos pais.

Desse modo, é fundamental promover nos ambientes educativos salesianos a criação de espaços de educação e formação dos pais e responsáveis. É interessante questionar: quanto tempo os pais dedicam para conversar com seus filhos? As refeições são feitas em família? Os pais priorizam a escuta de seus filhos? Estão atentos ao que fazem? Sabem quantas horas os filhos dedicam para as atividades on-line?

Não se trata de culpabilizar as famílias nem mesmo de desconsiderar as altas jornadas de trabalho e as dificuldades que os pais encontram para dar o necessário para seus filhos. Existe, sim, um ritmo de vida que compromete os tempos e espaços de convivência saudável em família, é uma triste realidade que faz parte do mundo moderno. Mas, mesmo assim, é importante gerar esse questionamento com as famílias, porque o que está em xeque são a saúde e o desenvolvimento de crianças e adolescentes, que são os mais vulneráveis e que precisam de atenção.

Nesse contexto, por mais problemático que seja, é importante que os ambientes educativos salesianos – sejam escolas, obras sociais ou paróquias – se debrucem sobre essas questões e busquem o diálogo, a parceria e a criatividade típica do carisma salesiano para que se possam criar alternativas viáveis para pensar e construir uma educação integral das crianças, dos adolescentes e dos jovens que passam pelas nossas mãos.

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