Família

Sagrada Família, por Julius Frank, 1908

Um pai como São José

Gustavo Cavagnari, SDB
Jesus aprendeu com José a como confiar em uma pai, uma figura não tão comum e muito necessária.

No Evangelho de Lucas, as primeiras e as últimas palavras que Jesus pronuncia durante sua vida referem-se ao Pai (2,49; 23,46). Não é à toa: os dois têm uma relação especial! Ele é “o” Filho (Mt 11,27; Mc 13,32; Lc 10,22; Jo 5,19) e o Pai é “seu” (Mt 16,17; Lc 22,29; Jo 5,17). Cristo tem tanta certeza de ser o Filho unigênito, amado e escolhido pelo Pai (Mt 3,17; Mc 1,11; Lc 3,22; Jo 10,17) que, com inusitada familiaridade, o chama de “Abbá” ( Mc 14,36): “Papai”.

Isso tudo nós sabemos. Mas gostaria que pensássemos juntos em um detalhe: como toda criança que cresce (Lc 2,52), Jesus não teria aprendido o que é um pai, como falar com ele e ouvi-lo, como respeitá-lo e confiar nele... se não fosse por São José. Quem, senão ele, o menino Jesus chamou de “abbá” pela primeira vez? Não lhe obedecia (Lc 2,51)? Não estava ao seu lado para aprender um ofício (Mc 6,3)? Portanto, se com o “sim” de Maria (Lc 1,38) Jesus teve uma mãe, com o “sim” de José (Mt 1,24) Jesus também teve um pai com quem aprendeu humanamente a ser filho.

Certamente José foi capaz de cumprir a elevada missão de criar Jesus graças a um dom especial do Pai celestial (Ef 3,15). Mas também é certo que ele se dedicou de corpo e alma: graças a sua fidelidade à missão que lhe foi confiada, Jesus pôde ver refletido em José aquele Pai que sabe do que seu filho precisa antes que ele o peça (Mt 6,8-32; 7,11).

Devemos admitir que pouco sabemos sobre São José. Segundo os Evangelhos, ele era descendente de David (Mt 1,20; Lc 1,27; 2,4). Ficou noivo e casou-se com Maria (Mt 1,18-19; 24-25; Lc 1,27). Sem o ter concebido (Mt 1,20), foi pai de Jesus (Mt 1,16-25; Lc 2,51; 3,23) e testemunha privilegiada dos seus primórdios (Lc 2,16; Mt 2,1-12). Trabalhou como carpinteiro (Mt 13,55; Mc 6,3) e emigrou com a família (Mt 2,13-15). Era um homem justo (Mt 1,19) e um judeu piedoso (Lc 2,21-22; 39; 41-50) que Deus guiou, nos momentos decisivos da sua vida, através de sonhos (Mt 1,20; 2,13; 19; 22). Talvez o que mais nos surpreenda é que, ao contrário de outras figuras que aparecem nos Evangelhos, não temos uma única palavra pronunciada por ele... De Maria há cinco frases curtas. De José, entretanto, nada de nada. E pensar que o filho se tornou um pregador!

São José carpinteiro, obra de Georges de La Tour, 1640
“O mundo precisa de pais”. E acrescenta: “a Igreja também”. Que São José nos ajude a encontrar estas figuras paternas de que necessitamos!

Buscam-se pais
Em sua carta apostólica Patris corde (8 de dezembro de 2020), o Papa Francisco soma-se ao Papas que refletiram sobre o papel central de José na história da salvação. Em sua mensagem, ele compartilha algumas ideias sobre que tipo de pai São José foi para o Redentor. Não vou repeti-las; mas destaco algo: se neste santo homem todos podemos encontrar um exemplo, um intercessor, um apoio ou um guia... ainda mais podem se espelhar nele os pais de família!

A paternidade é um tema que interessa muito ao Papa Francisco. Em primeiro lugar, porque ninguém nasce pai, mas se torna pai. E nos dias de hoje, aprender a ser pai é complicado. Em segundo lugar, porque os filhos muitas vezes sentem que não têm pais, mesmo quando os têm. Os números 176-177 da encíclia Amoris Laetitia falam disso: em muitas sociedades, a figura do pai está simbolicamente desviada ou desbotada; sua autoridade é vista com suspeita; sua masculinidade é questionada; seu papel é deslegitimado.

Nesse contexto, como diz o psicanalista Massimo Recalcati em seu livro O complexo de Telêmaco, é urgente resgatar a figura do pai. Não o “pai-patrão” autoritário ou censor, mas o “pai-testemunha”, aquela presença masculina nítida e definida que, junto com a mãe, está próxima aos filhos durante seu crescimento, que aponta os horizontes, os acompanha com amor e firmeza, e assume a responsabilidade de transmitir a eles um legado de vida e de fé. O Papa o repete, em sua carta Patris corde: “O mundo precisa de pais”. E acrescenta: “a Igreja também”. Que São José nos ajude a encontrar estas figuras paternas de que necessitamos!

* Artigo publicado originalmente no Boletín Salesiano Argentina – junho de 2021. (Clique aqui para ler o original)

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