Neste ano, a Igreja no Brasil nos oferece a nova tradução para a língua portuguesa do Missal Romano. Com este momento histórico, gostaria de destacar uma frase da Oração Eucarística para as diversas circunstâncias I, que diz: “[...] neste mundo dilacerado por discórdias, o vosso povo brilhe como sinal profético de unidade e concórdia”.
De fato, neste trecho podemos encontrar duas verdades: a primeira é que estamos num mundo dilacerado pela desumanização dos seres humanos, pela discórdia, pela violência, pela indiferença. A segunda é que somos cristãos e, por isso, devemos fazer a diferença positiva na vida de outras pessoas de modo que possamos brilhar como luzes e como saídas neste mundo que tanto precisa de amorosidade, acolhimento, cuidado e paz.
Infelizmente, estamos marcados por guerras e por discórdias que acontecem dentro de nossos lares, comunidades e grupos. E, às vezes, por motivos irrelevantes. Somos capazes de nos importar com detalhes litúrgicos, mas nos “desimportamos” com o irmão que sofre, que passa fome; nos “desimportamos” com as pessoas que caminham conosco nesta viagem da vida e as tratamos com indiferença, quando não com desprezo. Somos capazes de passar pelo outro sem ao menos oferecer um cumprimento de “bom dia”, de “boa tarde”, e vamos, dessa forma, dilacerando cada vez mais o mundo em que habitamos. Temos, cada vez mais, dificuldade em ser sinais proféticos de amor, de unidade e de testemunho de Jesus.
Ser cristão na acolhida
Não existe Evangelho e muito menos seguimento de Jesus sem acolhimento das pessoas e sem encontro com elas. Jesus acolheu, indiscutivelmente, a todos. Seu critério para o acolhimento é o de que seja ser humano; sua forma para o acolhimento é o respeito, condição básica para o encontro e o diálogo com o outro. Respeito que possibilita enxergar o outro como semelhante, como pessoa.
Assim, ser cristão é ir além dos sacramentos que são a base de nossa fé católica. É, apoiado e sustentado neles, ter a capacidade de sair da comodidade para ir ao encontro do outro. Assim fez Dom Bosco ao seguir os passos de Jesus: ofereceu a sua vida como presente aos jovens. Foi homem de profunda oração na ação.
A oração de Dom Bosco foi concreta. Pregava a paz e a unidade num mundo que também estava dilacerado pela indiferença, pelo não reconhecimento das juventudes e pela falta de oferta de opções dignas e respeitosas aos jovens. Neste cenário, Dom Bosco viveu de modo profundo e acertado o seu cristianismo. Procurou acolher os jovens oferecendo a eles uma vida mais digna, mais justa. Foi uma luz, que por amor a Jesus, brilhou para os jovens em meio às trevas. Este é o papel do cristão: ser luz para um mundo que por vezes parece estar perdido na escuridão.
Como ser um bom cristão?
Você, querida/o jovem, já deve ter notado que as nossas igrejas, de um modo geral, sobretudo aos domingos, se fazem cheias e por vezes faltam até assentos para acomodar os fiéis. Você já pensou que diferença faria no mundo se todas essas pessoas agissem fora da igreja com atitudes evangélicas, se do meio delas fosse retirado todo o espírito de fofoca que busca desmoralizar o outro, se desaparecesse a tentação de serem donas da verdade, se tais pessoas corassem de vergonha ao se colocarem ousadamente no lugar de Deus para julgar as pessoas?
Se todos nós fossemos cristãos que agem como discípulos de Jesus, se escolhêssemos ser verdadeiramente sal da terra e luz do mundo (Mt 5, 13-14), teríamos um mundo mais bonito, justo, digno, temperado, saboroso e mais humano.
Certo dia um jovem me perguntou: “Como ser um bom cristão?”. Não sou adepto de receitas prontas porque nenhuma vida é igual a outra, mas disse a este jovem que eram imprescindíveis duas atitudes: conhecer Jesus por meio do Evangelho e colocar as suas atitudes em prática no cotidiano da vida. Não posso ser um cristão que, sendo batizado, pouco conheço da vida de Jesus ou me interesso por ela. Que, participando das missas todos os dias, faço-me capaz de ir dormir ressentido com pessoas ou, pior, sendo capaz de fazer algum mal a elas.
Ao contrário, ser luz do mundo, ser cristão, é perceber as mazelas do mundo e tentar acolher bondosamente o próximo, colocando-se no lugar do outro ou, ao menos, iluminar o caminho para o próximo, procurando entender as suas necessidades e sofrimentos. É caminhar para que a paz aconteça nas relações, começando pelos nossos lares. É procurar a reconciliação em busca de um mundo mais fraterno, com menos discórdias, com menos rancores.
Ser cristão é ser profeta do amor, anunciando um Deus que nos ama, que nos quer felizes e em paz. É ser sinal profético de unidade e paz neste mundo dilacerado pelas injustiças, pelas desonestidades, pela indiferença.
Neste mês em que celebramos a festa de todos os santos, busquemos a santidade. Santidade que se concretiza na vida cotidiana e no encontro com o outro, como podemos perceber em Dom Bosco, em São Domingos Sávio, em Santa Maria Domingas Mazzarello e em tantos outros modelos de santidade que fizeram de sua vida uma releitura do Evangelho de Jesus. Deus os abençoe hoje e sempre.
Fernando Campos Peixoto, SDB, é professor de Filosofia, teólogo e mestrando em Educação pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), MS.