Pietro Luigi (Pedro Luís) Comollo nasceu em Pra, uma pequena aldeia do município de Cinzano (Turim), em 7 de abril de 1817. Ao falar de Luís Comollo nas Memórias do Oratório, Dom Bosco enquadra todo o episódio numa intervenção direta de Deus: “Naquele ano perdi um dos meus melhores colegas. O jovem Paulo Braia, meu querido e íntimo amigo, verdadeiro modelo de piedade, resignação e fé viva. […] O Senhor, porém, dignou-se compensar esta perda com outro companheiro, tão virtuoso como aquele, cuja fama, porém, se tornou ainda maior. Foi Luís Comollo”.
O encontro com Dom Bosco ocorreu em 1834, em uma escola pública no pátio interno da Via Vittorio Emanuele, nº 45. Dom Bosco estudava Retórica e Luís chegou para completar o quarto ano de Latim. Encontram-se numa situação inusitada: por conta de uma brincadeira e do comportamento violento de outro estudante, Comollo leva duas bofetadas no rosto e responde apenas: “Se isso for suficiente para te satisfazer, vá em paz, eu já te perdoei”. João fica admirado, pois Comollo permanece “inteiro”, “unificado” no seu interior, sustentado pela harmonia e unidade com Jesus Cristo, que comunica a capacidade de amar e perdoar. João Bosco, que naquela época da sua vida ainda não possuía uma unidade interior e reagia quase sempre a partir da sua “humanidade irascível”, recebe o seguinte conselho de Luís: “Sua força me assusta, mas acredite, Deus não lhe deu para massacrar seus companheiros. Ele quer que amemos uns aos outros, perdoemos uns aos outros e façamos o bem àqueles que nos fazem mal”.
Nas Memórias do Oratório, Dom Bosco diz o seguinte sobre a sua relação com Comollo: “Desde então sempre o tive como amigo íntimo e posso dizer que com ele comecei a aprender a viver como cristão. Depositei total confiança nele e ele em mim”. Tão forte é o impacto desta amizade, que Dom Bosco aplica a ela uma frase dita anteriormente apenas para Cafasso, seu guia espiritual: “colocando-me de fato em suas mãos”. Colocar-se nas mãos equivale ao abandono confiante que, a partir deste vínculo, Deus usará para dar a conhecer a sua vontade.
O jovem João Bosco projeta em Luís um modelo de amizade que é reflexo da “amizade em Deus”. Teria ainda um longo caminho a percorrer para se tornar “São João Bosco”, mas seu amigo Comollo é o anjo que Deus colocou ao seu lado para acompanhá-lo: “De fato, esta amizade transforma-se num verdadeiro acompanhamento espiritual, um acompanhamento que é essencialmente amizade, mas uma amizade em Deus, por esta razão: me deixava guiar para onde e como ele queria”.
Desta amizade especial, é possível compreender algumas intuições significativas de Dom Bosco:
O amigo é um presente de Deus: “O Senhor, porém, dignou-se compensar esta perda com outro companheiro tão virtuoso”.
A amizade espiritual é tão importante que estabelece um antes e um depois na sua vida de fé: “Desde então comecei a viver como cristão”.
A caridade e a mansidão como núcleo do Evangelho: “Ele (Jesus) quer que nos amemos, nos perdoemos e façamos o bem a quem nos faz o mal”.
Amizade na atualidade
A amizade espiritual é uma experiência repetida e testemunhal na Igreja. Teresa e João da Cruz; Francisco de Sales e Joana de Chantal; São Bento e Santa Escolástica, sua irmã-amiga; São Francisco de Assis e Santa Clara. Eis alguns exemplos! Mas a relação de amizade de Dom Bosco com Luís Comollo vai além do conceito de guia espiritual, então reservado aos sacerdotes, e se estende para o amigo que o acompanha. “Eu admirei a caridade do companheiro e, de fato, colocando-me em suas mãos, ele permitiu que eu fosse guiado para onde e como ele quisesse”. Esta compreensão, totalmente nova para a época, ainda tem muito a ensinar para a prática do acompanhamento integral salesiano nos dias de hoje.
Dom Bosco parece querer afirmar que é preciso ter amigos para seguir o caminho do crescimento humano e cristão. Os traços da amizade entre os dois jovens são: confiança, intimidade e complementaridade, que revelam um vínculo profundamente humano. Ao mesmo tempo, também é uma experiência de comunhão e pertencimento, presentes na dimensão de uma comunidade que vive o mandamento do amor recíproco.
Lembremos da experiência do Oratório de Dom Bosco e da Companhia da Imaculada Conceição, uma prodigiosa comunidade de amigos que se ajudam a ser santos e a santificar o ambiente, tão bem ilustrada na vida de Miguel Magone. O Oratório consiste, no fundo, de uma incrível assistência entre pares para ouvir, orientar e guiar através de um processo de conversão. De certa forma, é a personificação do ambiente de família e de amizade, essencial para o acompanhamento salesiano.
Propostas para reflexão
Poderíamos dizer que Comollo é quase um “emblema” ou “paradigma” de amizade. Diante disto, algumas reflexões podem ser oportunas para repensar formas de acompanhamento integral salesiano na atualidade:
• Em minha vida, tenho alguma experiência de amizade semelhante à que João Bosco viveu com Luís Comollo?
• O que é possível fazer para viver a capacidade de cultivar uma amizade espiritual?
Texto elaborado a partir de anotações pessoais e material de apoio do curso “Escola Salesiana de Acompanhamento Integral”, realizado em novembro de 2024, na cidade de Quito, Equador.