Projeto Pessoal de Vida

O trabalho mata o salesiano?

Com a proposta do Projeto Pessoal de Vida, devemos incluir um tema que considero importante na nossa mística e ascese: o trabalho.
Pe. João Mendonça, SDB

Dom Bosco recebia algumas críticas, inclusive de salesianos, porque não permitia que, nas férias, gastassem o tempo sem nada fazer, numa espécie de ócio ferial.

Nas Memórias Biográficas, volume 12, p. 322-323, temos uma reflexão de Dom Bosco sobre três pilares da nossa vida: trabalho, descanso e temperança. Com a morte de vários jovens e salesianos em curto espaço de tempo, corria na época o comentário de que os salesianos morriam de tanto trabalhar. Dom Bosco rebate e diz que o “cuidado da saúde não significa viver sem nada fazer”. Trata-se do cetera tolle (o resto) que, aos poucos, pode se transformar em Feriae mihi opus sunt, preciso de férias! E nada mais do que férias.

Numa carta ao padre Júlio Barberis, datada de 17 de agosto de 1876, Dom Bosco se referia ao descanso da seguinte forma: “O descanso do corpo não seja nocivo para a alma. Revigora-se o corpo e a alma, sempre que se façam as nossas habituais práticas de piedade em comum” (MB, vol. 12, p. 324). Alguém pode perguntar: na era das férias – porque hoje tudo é motivo de férias: um feriado, o tríduo pascal, uma data cívica que caia na quinta-feira – o que fazer? Como agir?

Dom Bosco apresenta três princípios importantes para compreender o real valor do trabalho, do descanso necessário e da temperança: 1. O ócio mata o salesiano; 2. Abundância de alimentos e bebidas mata o salesiano; 3. Murmurações e queixas matam o salesiano.

O ócio mata o salesiano!
Para Dom Bosco, o que de fato pode acabar com a vida de um salesiano, tanto física quanto moral, é a ociosidade. Quer dizer, fazer pouco ou nada, perder o tempo fechado no próprio mundo sem estar presente no trabalho educativo evangelizador, cuidar mais dos meios digitais do que das relações interpessoais, deixar-se paralisar pela preguiça e pelas mordomias que o cotidiano pode proporcionar, fugir dos compromissos comunitários porque não pode “perder tempo”. Isto mata. Isola. Enfraquece.

Dom Bosco era muito claro em relação aos fatos de sua época que levaram muitos padres e religiosos(as) à falência vocacional. Aqueles eram tempos políticos agitados, a campanha anticlerical era avassaladora, o desgaste da figura do presbítero ante a sociedade causava ataques pessoais e até violências. Então, havia uma preocupação de manter íntegras tanto a vida pessoal – testemunho – quanto o engajamento social e religioso.

O salesiano trabalha para viver de forma honesta e digna sua vocação.

A abundância de alimentos e bebidas mata o salesiano!
Nas casas salesianas dos inícios da Congregação, sobretudo em Valdocco, o alimento era importante, porém, sempre na medida da pobreza e nunca da ostentação. A virtude da pobreza evangélica era o filtro por onde passava toda e qualquer opção quanto aos alimentos e, sobretudo, quanto à bebida. Camponês dos Becchi crescido em meio aos vinhedos e ao bom vinho, Dom Bosco não era inimigo da bebida, mas sempre se mantinha na justa medida, sem perder a temperança. O problema não é a bebida disponível, mas a falta de controle, de bom senso, de escândalo que um salesiano pode proporcionar quando não sabe a medida dos seus limites ou se deixa dominar pela doença do alcoolismo.

Comer demais, viver de festa em festa, de copo em copo, é um perigo para o que Dom Bosco chamava de temperança, ou seja, o bom tempero, o sabor do modo de agir sem escorregar na bebedeira ou na gula.

Murmurações e queixas matam o salesiano!
Dom Bosco tinha verdadeira ojeriza às lamentações, murmurações e insatisfações, que criam uma casca na personalidade da pessoa, alimentam a discórdia, a fofoca e as divisões na comunidade. Por isso, ele insistia tanto, na famosa Carta de Roma, que a familiaridade, a proximidade e a alegria eram elementos importantes para o bem-viver na comunidade oratoriana. Quando as intrigas tomam o lugar da confiança e da familiaridade, então o salesiano morre em amarguras, em desconfianças.

Acredito que seja importante, no dinamismo da animação vocacional, que não se deixe de lado o tema do trabalho na nossa espiritualidade. O salesiano trabalha para viver de forma honesta e digna sua vocação. Não é à toa que nas Constituições encontramos o seguinte pensamento: “Operosidade incansável, santificada pela oração e pela união com Deus, que deve ser a característica dos filhos de São João Bosco” (C, 95).

Concluo com um pensamento de Dom Bosco sobre o cuidado da saúde, publicado no Boletim Salesiano de setembro de 2024:

A saúde é o dom de viver plenamente para poder trabalhar, gastar a vida pelo ideal e ser proativo na ação. Na Ratio encontramos uma prática orientação sobre isto quando diz: “O estilo salesiano de vida e de ação requer habitualmente boa saúde física, com uma grande capacidade de trabalho. Dom Bosco recomendava aos noviços: preciso que cresçais e vos torneis jovens robustos, a fim de mais tarde poderdes trabalhar muito, pois quem quiser entrar na Congregação deve amar o trabalho” (Ratio, n. 59). É por isso, seguindo a Ratio, que o salesiano: zela pela saúde, ama o trabalho cotidiano, assume um ritmo de vida e de trabalho ordenado, garante e programa todos aqueles elementos que favorecem o equilíbrio físico (Ratio, n. 60).

[...] Ser saudável, longevo, requer a disciplina consigo mesmo e Dom Bosco recomendava sempre boa alimentação, descanso, higiene e trabalho, como um conjunto do bem-viver. Além do mais, agradecer e cuidar de si mesmo é corresponder ao dom da saúde que recebemos de Deus.

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