A Madre-Geral emérita do Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora, Ir. Yvonne Reungoat, esteve no Brasil em janeiro para orientar os retiros espirituais da Inspetoria Madre Mazzarello, e compartilhou com as Irmãs a rica experiência de participar do Sínodo dos Bispos, convocado pelo Papa Francisco.
Ir. Yvonne é uma das três mulheres nomeadas para o Dicastério dos Bispos, participando ativamente no processo de nomeação de bispos e administradores apostólicos e, desde 2019, é membro da Congregação Vaticana para a Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica.
Ela também foi convidada para participar da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos. Na primeira sessão do Sínodo, realizada em outubro de 2023, Ir. Yvonne colaborou como facilitadora dos grupos de discussão, mesmo papel que cumprirá na segunda sessão, prevista para outubro deste ano. Leia a seguir alguns trechos do relato de Ir. Yvonne sobre a estrutura inovadora e as principais reflexões feitas durante o Sínodo.
Fiquei preocupada quando soube que participaria do Sínodo, porque não me sentia preparada. Mas, no primeiro dia, muitos ali presentes também falaram que estavam preocupados, porque seria tudo novo e todos os povos esperavam muito do Sínodo. Ninguém sabia o que iria acontecer, mas o Senhor está presente e, nesse momento, houve a passagem do medo à confiança. Isso foi muito marcante e eu senti que vocês, Irmãs, estavam junto comigo, pois sabia que o Instituto rezava pelo Sínodo.
Os três primeiros dias foram de retiro, fora de Roma, com a meditação da espiritualidade da sinodalidade. A vigília foi ecumênica, na Praça São Pedro. O Papa Francisco estava no mesmo nível dos líderes das outras Igrejas, todos rezaram juntos e houve participação deles nas leituras. Havia cerca de 2 mil jovens presentes e foi lindo fazer silêncio, todos juntos!
O Sínodo foi na Sala Paulo VI, que foi preparada para isso. Havia 36 mesas redondas, cada uma com 12 lugares. Participaram 464 pessoas, das quais 365 eram votantes – e havia muitos que estavam participando como membros pela primeira vez, isso foi uma grande mudança. Estavam presentes 85 mulheres, das quais 54 votantes, pela primeira vez na história. Outros não eram membros, não puderam votar, como eu, que estava como facilitadora; mas pudemos participar efetivamente e isso também foi uma grande mudança.
O clima do Sínodo foi de grande fraternidade, serenidade, abertura recíproca, alegria e muito respeito. Não que todos estivessem de acordo em tudo, mas escutavam para compreender. Houve um alargamento de horizontes porque nesse Sínodo todos tiveram a possibilidade de falar.
Metodologia: conversação no Espírito
O Papa recordou que o Sínodo não era um parlamento, mas a escuta do Espírito Santo e do que ele diz para a Igreja. Para essa dinâmica, de colocar-se na escuta do Espírito, foram muito importantes as eucaristias na abertura de cada módulo, as laudes, as orações à tarde...
Foram definidos quatro módulos: Igreja Sinodal e suas características, Comunhão, Participação e Missão. Para cada módulo, que durava dois dias completos, formaram-se cinco grupos e foram distribuídos cinco formulários. O trabalho em grupos foi realizado em três fases e, como a mesa era redonda, todos eram iguais.
Iniciávamos com as orações e depois uma rodada para que cada representante falasse o que havia preparado. Três pessoas falavam, depois fazíamos um momento de silêncio para rezar e interiorizar o que havia sido dito, outras três falas seguidas do momento de silêncio e assim até que todos tivessem oportunidade de participar.
Na segunda rodada, cada um falava sobre como havia sido tocado, o que lhe parecia importante, o que fez ressonância dentro de si ou até alguma pergunta. A terceira rodada era para levantar o que parecia ao grupo como importante para partilhar com a Assembleia: as convergências, as divergências, questões e propostas. Ao final dessa terceira fase era preparado um texto de três minutos para ser apresentado à Assembleia, resumindo o que se havia conversado. Uma pessoa de cada grupo apresentava à Assembleia esse texto e depois todos podiam participar livremente.
Após a Assembleia, os grupos retomavam os trabalhos e podiam mudar ou ampliar o texto inicial, que depois era entregue à Secretaria do Sínodo, para a redação. Era feito um primeiro rascunho, para ser rediscutido nos grupos e serem propostas ainda mudanças e emendas. Cada alteração precisava ser votada e só então o texto, aprovado pela maioria, voltava para a Secretaria do Sínodo para a redação final. Todo esse processo foi feito em cada módulo.
A conversação no Espírito facilitou muito o discernimento, porque as pessoas não eram obrigadas a estar sempre de acordo. Deveriam estar de acordo somente que aquilo era o que o grupo havia aprovado. Isso criou serenidade e abertura. Muitos descobriram coisas que não conheciam de outros contextos e viram que o que é problema em um lugar, pode não ser uma dificuldade em outro.
Participação das mulheres e vida religiosa
As principais mudanças apontadas na primeira sessão do Sínodo foram sobre a participação da mulher na Igreja e sobre a Vida Religiosa Consagrada. Isso é um sinal positivo, porque se amadureceu muito sobre essas questões no curso da Assembleia Sinodal.
Já citei que havia 85 mulheres participando e que 54 eram votantes. A representação dos Superiores Gerais foi de 10 pessoas, sendo a paridade de cinco superiores e cinco superioras gerais. Também foram convidadas duas presidentes delegadas, do Japão e do México, e cada uma delas guiou uma jornada. Muitos salientaram que a participação das mulheres e dos leigos mudou algo na Assembleia Sinodal. A participação foi evidente e a reciprocidade foi sentida.
No Sínodo houve a coragem de se expressar com liberdade sobre várias questões relacionadas às mulheres. Entre as convergências que tivemos está a percepção de que é necessário promover uma Igreja em que homens e mulheres dialoguem para buscar os desígnios de Deus, sem subordinação ou submissão. Foram expressos muitos sofrimentos, abusos, machismo, desprezos, exclusões, clericalismo. Um dos poucos momentos em que o Papa falou foi justamente sobre o clericalismo, como um abuso de poder; e a questão do poder não é secundária, mas o caminho de conversão é possível.
As pessoas consagradas, homens e mulheres, também deram contribuições importantes. As consagradas e os consagrados são muito sensíveis às pobrezas, isso a partir da própria experiência, que é empenhada na missionariedade da Igreja. Essa experiência influenciou no Sínodo a reflexão sobre tornar os pobres protagonistas na Igreja, porque eles têm o rosto de Cristo.
No Sínodo o tema da vida consagrada teve um espaço significativo. E a reflexão avançou neste Sínodo, pois percebeu-se, entre outros pontos, que a Igreja precisa da profecia da vida consagrada e que é necessário reconhecer que a sinodalidade faz parte desde a origem da vida consagrada, na sua estrutura e nas suas assembleias (ou nos Capítulos Gerais, no âmbito Salesiano), na corresponsabilidade da vida comunitária, na autoridade compartilhada.
Formação no Sínodo
Um tema transversal sempre presente foi a formação. Como a Igreja sinodal deve cuidar da formação inicial e permanente? Primeiro, a formação dos bispos, dos sacerdotes e do povo de Deus. Se os bispos não entram no espírito da sinodalidade, não se fará a diocese sinodal. E assim para os sacerdotes e para a vida religiosa. A estrutura não faz a sinodalidade; ela ajuda. São as pessoas que se formam no espírito da sinodalidade que farão crescer essa dimensão na vida da Igreja em todos os níveis.
Foi muito importante a experiência da sinodalidade vivenciada na prática durante esta primeira fase do Sínodo. Mas como fazer para motivar todas as pessoas, ministros ordenados e batizados, a entrar no processo sinodal em curso? Como vencer as resistências que às vezes se manifestam? Assim, é um processo. Da sinodalidade vivida e experimentada depende a missão para ser sinal de comunhão no mundo. E, para favorecer esse caminho, é importante a formação: formar à sinodalidade na sinodalidade!