Mensagem do Reitor-Mor

Profetas do perdão e da gratuidade

Nestes tempos, em que as notícias, diariamente, nos comunicam experiências de conflito, de guerra e de ódio, há o grande perigo de que acabemos por ser envolvidos numa leitura dos acontecimentos que se reduz somente ao nível político ou então nos limitemos a tomar posição a favor de uma parte ou de outra com argumentos que têm a ver com a nossa maneira de ver as coisas, com a nossa maneira de interpretar a realidade.
Pe. Fabio Attard – Reitor-Mor dos Salesianos

No discurso de Jesus que se segue às bem-aventuranças, há uma série de “pequenas/grandes lições” que o Senhor nos oferece. Começam sempre com o versículo “vocês ouviram o que foi dito”. Numa delas o Senhor recorda o antigo ditado “olho por olho e dente por dente” (Mt 5,38).

Fora da lógica do Evangelho, esta lei não só não é contestada, mas pode mesmo ser tomada como regra que exprime o modo de ajustar as contas com aqueles que nos ofenderam. Vingar-se é percebido como direito, até ao ponto de chegar a ser também um dever.

Jesus apresenta-se diante desta lógica com uma proposta completamente diferente, totalmente oposta àquilo que ouvimos, Jesus diz-nos: “Eu, porém, lhes digo” (Mt 5,39). E aqui como cristãos devemos prestar muita atenção. As palavras de Jesus que se seguem são importantes não somente por si mesmas, mas porque exprimem de uma maneira muito sintética toda a sua mensagem. Jesus não nos diz que há outro modo de interpretar a realidade. Jesus não se aproxima de nós para alargar o espectro das opiniões a propósito das realidades terrenas, de modo particular as que se referem à nossa vida. Jesus não é outra opinião, mas Ele mesmo incarna a proposta alternativa à lei da vingança.

A frase “Eu, porém, lhes digo” é de fundamental importância porque agora já não é a palavra pronunciada, mas a pessoa mesma de Jesus. Aquilo que Jesus nos comunica é o que Ele mesmo vive. Quando Jesus diz “não se vinguem de quem fez o mal a vocês. Pelo contrário: se alguém lhe dá um tapa na face direita, ofereça também a esquerda!” (Mt 5,39), estas mesmas palavras viveu-as em primeira pessoa.

Para voltar aos nossos tempos, essas palavras de Jesus correm o risco de ser interpretadas como as palavras de uma pessoa fraca, como algo de quem não é capaz de reagir, mas só de sofrer. E, com efeito, quando não olhamos para Jesus que se oferece totalmente no madeiro da Cruz, esta é a impressão que podemos ter. Contudo, sabemos muito bem que o sacrifício na Cruz é fruto de uma vida que parte da frase “Eu, porém, lhes digo”. Porque tudo aquilo que Jesus nos disse, assumiu-o Ele plenamente. E, assumindo-o plenamente, conseguiu passar da Cruz à vitória. A lógica de Jesus é uma lógica que aparentemente mostra uma personalidade perdedora. Mas sabemos muito bem que a mensagem que Jesus nos deixou, e que Ele viveu plenamente, é o remédio de que este mundo hoje tem tanta necessidade.

istock - Marcio Binow da Silva

O perdão não é sinal de fraqueza, mas a liberdade mais eloquente de quem responde ao mal com o bem.

Profetas do perdão
Ser profetas do perdão significa assumir o bem como resposta ao mal. Significa ter a determinação de que o poder do maligno não condicionará o meu modo de ver e de interpretar a realidade. O perdão não é a resposta do fraco. O perdão é o sinal mais eloquente daquela liberdade que é capaz de reconhecer feridas que o mal deixa dentro de si, mas que essas mesmas feridas nunca serão um paiol que fomenta a vingança e o ódio.

Reagir ao mal com o mal só serve para agravar e aprofundar as feridas da humanidade. A paz e a concórdia não crescem no terreno do ódio e da vingança.

Profetas da gratuidade
Ser profetas da gratuidade exige de nós a capacidade de ver o pobre e o indigente não com a lógica do lucro, mas com a lógica da caridade. O pobre não escolhe ser pobre, mas quem está bem tem a possibilidade de escolher ser generoso, bom e cheio de compaixão. Como seria diferente o mundo se os nossos líderes políticos, nesse cenário em que crescem os conflitos e as guerras, tivessem a sensatez de olhar para aqueles que pagam o preço dessas divisões: os pobres, os marginalizados, aqueles que não podem escapar porque não conseguem.

Se partirmos de uma leitura puramente horizontal, há motivo para desesperar. Só nos resta ficar fechados nas nossas murmurações, nas nossas críticas. Mas não! Nós somos educadores dos jovens. Sabemos bem que esses jovens, neste nosso mundo, andam em busca de pontos de referência de uma humanidade sadia, de líderes políticos capazes de interpretar a realidade com critérios de justiça e de paz. Mas, quando os nossos jovens olham à sua volta, sabemos bem que descobrem sempre o vazio de uma visão pobre da vida.

Nós, que estamos empenhados na educação dos jovens, temos uma grande responsabilidade. Não basta comentar o vazio deixado por uma ausência quase completa de liderança. Não basta comentar que não há propostas com a capacidade de entusiasmar os jovens. Compete a cada um e a cada uma de nós acender a lâmpada de esperança nesta escuridão, oferecer exemplos de humanidade conseguida no cotidiano.

De fato, vale a pena hoje ser profetas do perdão e da gratuidade.

Baixe esta matéria em PDF

Reveja
Editorial

A seguir
Memórias Biográficas

© 2025 Copyright - Boletim Salesiano Brasil